2006-10-27

PAPEL DOS PAIS NO DESPORTO

"Uma noite tive um pesadelo horrível! Sonhei que estava sentado no banco da equipa adversária à do meu filho, no jogo que ditava o campeão nacional. Com o jogo empatado a um minuto do fim, o meu treinador ordena-me que entre no jogo. Assim que o faço, consigo roubar a bola ao meu filho a meio campo e patino isolado para a baliza. Tenho uma criança de nove anos pela frente, o guarda redes solitário. Olho para trás, vejo o treinador a pedir ao meu filho para me alcançar, enquanto ele "corre" na minha direcção. Estou quase a chegar à área. O guarda redes tão pequenito na baliza, olha-me nos olhos... lembro-me de pensar, espero que o meu filho me tire a bola ou marco golo?"

Pressão parental, receio por parte dos atletas das avaliações negativas, comportamentos positivos, divertimento e prazer... são uma série de expressões que giram à volta do conceito relação entre pais e filhos no desporto.
Relativamente à competição, esta deve ser encarada como um meio de comparação em relação ao passado e, só depois, como referência comparativa em ralação aos colegas e adversários desportivos. Os atletas com maiores probabilidades de sucesso na competição são aqueles que lutam e estão motivados para obter um nivel de excelência, assumem mais facilmente responsabilidades pelos actos, correm riscos para aprender e obtêm feedback de apoio e, maior gozo e prazer na busca da vitória e da melhoria pessoal. Quanto aos motivos que levam as crianças a iniciar e manter a práctica desportiva são essencialmente, o facto quererem divertir-se, melhorar e aprender destrezas físicas, conviver e fazer novos amigos, viver as emoções da modalidade, conseguir uma boa condição física e por fim, ganhar e ter êxito desportivo. Já no que diz respeito ao abandono do desporto, as causas apontadas como as mais frequentes são o facto de ter outras coisas para fazer, a modalidade não era o que eu pensava, o desejo de praticar outra modalidade, não gostar do treinador ou ainda, o treinador ser demasiado duro.
Ora, quer no conceito de competição, quer nos factores que levam as crianças a iniciar/manter ou abandonar a práctica desportiva, há um papel fulcral a desempenhar pelos pais.
Existem os pais excessivamente críticos, os descontrolados, os treinadores de bancada, os pais super protectores e os pais desinteressados. Assim sendo, é importante referir que, qualquer uma destas atitudes parentais poderão funcionar como uma fonte de pressão e stress para as crianças. Reparem no seguinte, os atletas que sentem excesso de ansiedade competitiva apresentam, uma tendência natural para serem anciosos ou nervosos, baixa auto-estima, pouca esperança em bons resultados, frequentes preocupações com as expectativas dos adultos e até mesmo a adquirem a opinião de que é importante praticar desporto devido às expectativas dos pais. Tudo isto são consequencias de um envolvimento excessivo dos pais, na vida desportiva dos filhos.
Opto aqui por apresentar duas vertentes aos pais:
1ª - Comportamentos e atitudes mais aconselhados e apropriados à competição desportiva de jovens: permanecer na zona reservada aos espectadores(excepção para os pais seccionistas, directores, etc...), evitar "aconselhar" o treinador sobre como orientar a equipa, evitar comentários depreciativos aos treinadores, árbitros e atletas, evitar ser o "treinador" do seu filho durante as competições, evitar comportamentos não saudáveis durante competições e treinos (fumar, beber álcool, etc..), apoiar a equipa do filho, demonstrar interesse, entusiasmo e apoio ao filho, controlar as emoções, demonstrar vontade de colaborar com o treinador, os dirigentes e os árbitros e demonstrar apreço pela forma como o treinador, os dirigentes e os árbitros dirigiram as competições e treinos.
2ª - Promover uma melhor comunicação entre pais e filhos: encorajamento do jovem a praticar desporto, mas sem o pressionar, perceber o que o atleta pretende do desporto e ajudá-lo a obter esses objectivos, definir o momento em que a criança deve começar a competir e assegurar-se de que tem à dispisição as condições ideais, assegurar-se que o treinador está qualificado, mater a vitória e o sucesso desportivo como um objectivo a atingir a longo prazo e estimular o jovem a fazer o mesmo, ajudar o atleta a traçar objectivos realistas, incentivar o jovem a aprender com o desporto, sensibilizar a criança a assumir as responsabilidades para com a equipa e treinador, utilizar a disciplina apenas quando necessário, não se intrometer no trabalho do treinador, fornecer ao treinador todas as informações necessárias sobre o estado e saúde da criança.
Desta forma, todas estas estratégias apresentam um conjunto de consequências positivas, por parte dos jovens, que percepcionam os pais como uma fonte de apoio social. Por conseguinte, as crianças e jovens com maior auto-estima apresentam niveis mais elevados de apoio social e emocional. Objectivamente, quanto menor a pressão parental maiores os niveis de divertimento e prazer na actividade desportiva. Há maior eficiencia no alcance deste nivel optimo, se não fomentada ansiedade, stress e esgotamento nas crianças fruto de atitudes e comportamentos negativos por parte dos pais.

Apesar de não ser de todo a minha especialidade profissional, efectuei esta reflexão sobre o tema relação entre pais e filhos no desporto. Esta análise é fundamental, para que haja essencialmente uma melhor compreensão por parte dos pais, do significado e importância do desporto na criança, estando estes sensibilizados para atitudes e comportamentos que promovam o crescimento e desenvolvimento psicologico e fisico dos seus filhos. Este artigo é dirigido a todos os pais mas fundamentalmente, aos que mais recentemente estão envolvidos nesta nova realidade.

Termino com o seguinte: As crianças sonham ser campeões mas têm o direito de não o ser.

Hugo Lagos


Fontes: American Sport Education Program (Sport Parent); Comunicação entre treinadores e pais (A.R.Gomes); Psychosocial interventions in youth sport (R.E.Smith)
Revisão técnica: Prof. Cajé